Em decisão monocrática o Ministro Luiz Fux negou provimento ao recurso especial e manteve o
indeferimento da candidatura de Carlos Marduque Silva Duarte.
Leia na Integra:
EMENTA:
ELEIÇÕES 2016. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO. VEREADOR. INDEFERIMENTO.
REJEIÇÃO DA CONTABILIDADE. TRIBUNAL DE CONTAS. IRREGULARIDADES INSANÁVEIS E
CONFIGURADORAS DE ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INELEGIBILIDADE
PREVISTA NO ART. 1º, I, G, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. RECURSO ESPECIAL A QUE
SE NEGA SEGUIMENTO.
Cuida-se de
recurso especial eleitoral interposto por Carlos Marduque Silva Duarte, com
alegada base no art. 276, I, b, do Código Eleitoral, em face do acórdão
prolatado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Ceará que, por unanimidade,
manteve o indeferimento de respectiva candidatura ao cargo de Vereador do
Município de Limoeiro do Norte/CE, nas eleições 2016. Eis a ementa do aresto
vergastado, verbis (fls. 1.797-1.798):
¿ELEIÇÕES
2016. RECURSO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO. CONTAS. REJEIÇÃO.
TRIBUNAL DE CONTAS DOS MUNICÍPIOS. SUBSÍDIO DE VEREADORES. DESCUMPRIMENTO AO
DISPOSTO NO ART. 29, VI, CF/88. AUSÊNCIA DE LICITAÇÃO. VIOLAÇÃO À LEI 8.666/93
E 8.429/92. AUSÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL SUSPENDENDO OS EFEITOS DA DECISÃO DA
CORTE DE CONTAS. APLICAÇÃO DA ALÍNEA "G", INCISO I, ART. 1º DA LC
64/90. PRECEDENTES DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL E DESTE REGIONAL. NÃO
PROVIMENTO DO APELO. REGISTRO INDEFERIDO.
1. Na espécie,
o Recorrente, candidato ao cargo de vereador, quando no exercício do cargo de
Presidente da Câmara de Vereadores de Limoeiro do Norte/CE, teve suas contas de
gestão desaprovadas pelo TCM/CE, em decisão irrecorrível, com aplicação de
multa, em virtude, dentre outras irregularidades, de pagamento a maior dos
subsídios dos Vereadores e ausência de certame licitatório no valor de R$
25.840,80. 2. Da análise da decisão da Corte de Contas, percebe-se que o
recorrente realizou pagamento a maior dos subsídios dos Vereadores de Limoeiro
do Norte durante o ano de 2005, em descumprimento ao disposto no art. 29, VI,
CF/88, o que, além de configurar vício insanável, encontra-se tipificado como
ato de improbidade administrativa, nos exatos termos do art. 10, incisos IX e
XI e art. 11, inciso I, da Lei nº 8.429/92. Verifica-se, ainda, que o Recorrente
deixou de realizar licitação quando a lei a exigia, causando, assim, prejuízo
ao erário, nos termos do art. 10, inciso VIII da Lei 8.429/92. Configuração de
ato doloso de improbidade administrativa, importando na inelegibilidade
prevista no art. 1º, inciso I, alínea "g" da LC 64/90. Precedente TSE
(Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº 400545, Acórdão de 28/10/2010,
Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Publicação: PSESS -
Publicado em Sessão, Data 28/10/2010)
3. Ante a
inexistência, no caso, de notícia acerca de decisão suspensiva ou anulatória
pelo Poder Judiciário da rejeição das contas do Recorrido, e não havendo dúvida
quanto a presença de todos os demais elementos necessários ao reconhecimento da
causa de inelegibilidade, outra alternativa não se apresenta, senão a manter a
sentença recorrida, indeferindo-se o registro de candidatura do Recorrente, por
ser ele inelegível.
4. Sentença
mantida. Pedido de registro de candidatura indeferido.
5. Recurso
conhecido e desprovido."
Nas razões do
especial, o Recorrente assevera ultrajado o art. 1º, I, g, da Lei Complementar
nº 64/1990 e aponta divergência jurisprudencial.
Afirma que, na
decisão que desaguou na desaprovação da respectiva contabilidade - enquanto
Presidente da Câmara dos Vereadores do Município de Limoeiro do Norte/CE ?, não
há qualquer anotação improbidade administrativa. Sustenta em seguida que as
falhas apontadas são de caráter meremente formal, as aquais não acarretaram
lesão ao erário.
Aduz que ¿a
irregularidade que culminou no Acórdão 4452/2009 se trata de verdadeira
confusão feita pelo Tribunal de Contas do estado do Ceará; porquanto havia
considerado que o município de Limoeiro do Norte possuía menos de cinquenta mil
habitantes, fazendo crer que o subsídio máximo de um vereador naquela urbe
seria de 30% (trinta por cento) daquele percebido por um deputado estadual nos
termos do Art. 29, VI, b da CF/88. Contudo, não fora esclarecido que, na
realidade, havia mais de cinquenta e um mil habtantes naquele município,
enquadrando o subssídio dos vereadores na alínea c do aludido dispositivo
constitucional; colocando o percentual comparado em 40%" (fls. 1.821).
Desta feita, afirma ter respeitado os limites preconizados no art. 29, VI, da
Constituição da República, considerando a porcentagem do subsídio de Deputado
Estadual em relação ao número de habitantes.
Relativamente
ao exercício financeiro de 2006, assevera que realizou o devido processo
licitatório para aquisição de combustível, deixando apenas de enviar cópias dos
documentos alusivos ao certame.
Ao final,
alega que as irregularidades apuradas não são insanáveis e nem configuradoras
de ato doloso de improbidade administativa.
Requer o
provimento do especial, para que seja reformado o acórdão impugnado,
deferindo-se o seu registro de candidatura.
O Recorrido
apresentou contrarrazões a fls. 1.834-1.844.
Não houve
juízo prévio de admissibilidade do recurso especial, conforme preconiza o art.
62, parágrafo único, da Resolução-TSE nº 23.455/2015¹.
A Procuradoria
Geral Eleitoral opina pelo desprovimento do especial (fls. 1.855-1859).
É o relatório.
Ab initio,
anoto que o recurso foi interposto tempestivamente e está subscrito por
procurador devidamente habilitado.
Assento, na
sequência, que a matéria de fundo travada não reclama o reexame de fatos e
provas. É que se extrai da moldura fática do acórdão hostilizado que a tese
jurídica posta ao exame desta Corte Superior Eleitoral cinge-se em se as
irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas do Ceará, que deram azo à
desaprovação das contas do Recorrente, amoldam-se, ou não, aos pressupostos
fáticos configuradores da inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC nº 64/90.
A discussão de
fundo, portanto, traduz quaestio iuris, prescindindo, por isso, da formação de
nova convicção acerca dos fatos narrados nos autos. Na feliz lição de Luiz
Guilherme Marinoni, "a qualificação jurídica do fato é posterior ao exame
da relação entre a prova e o fato e, assim, parte da premissa de que o fato
está provado. Por isso, como é pouco mais que evidente, nada tem a ver com a
valoração da prova e com a perfeição da formação da convicção sobre a matéria
de fato. A qualificação jurídica de um ato ou de uma manifestação de vontade
acontece quando a discussão recai somente na sua qualidade jurídica"
(MARINONI, Luiz Guilherme. "Reexame de prova diante dos recursos especial
e extraordinário" . In: Revista Genesis de Direito Processual Civil.
Curitiba, núm 35, p. 128-145).
Em vista
disso, impõe-se o enfrentamento das alegações deduzidas, afastando, assim, a
incidência do Enunciado da Súmula nº 24 deste Tribunal Superior Eleitoral, que
interdita o reexame de fatos e provas na via do apelo nobre eleitoral.
Prossigo,
desse modo, à análise da questão de fundo.
A depender do
elemento analisado, haverá a ampliação ou a redução da cognição realizada pelo
juiz eleitoral, franqueando-lhe, em consequência, a prerrogativa de formular
juízos de valor acerca da ocorrência in concrecto de alguns deles. Com efeito,
existem elementos do tipo que manietam, em alguma medida, a cognição horizontal
do juiz: requer menor amplitude intelectiva identificar se o indivíduo
desempenha cargo ou função pública, bem como saber se o pronunciamento exarado
é suscetível de impugnação (requisito da irrecorribilidade), ou se há, ou não,
suspensão ou anulação judicial do acórdão de rejeição das contas.
Noutro giro, a
tipologia da alínea g traz em seu bojo, ainda, requisitos que habilitam o
magistrado eleitoral a exarar juízos de valor concretos acerca de cada um
deles. Assentar o caráter insanável de uma irregularidade apurada ou qualificar
certa conduta ímproba como dolosa ou culposa, por exemplo, não se resume a uma
atividade intelectiva meramente mecânica. Ao revés, envolve maior espectro de
valoração, notadamente quando o acórdão de rejeição de contas for omisso quanto
à análise desses elementos ou sempre que o fizer de forma açodada, sem
perquirir as particularidades das circunstâncias de fato. Daí ser possível
formar juízos de valor acerca da presença desses pressupostos à luz das
premissas fáticas constantes da moldura do título proferido pela Corte de
Contas que fundamenta a impugnação de registro.
A melhor
doutrina eleitoralista perfilha similar entendimento. Para Rodrigo López Zílio,
¿é a Justiça Eleitoral quem, analisando a natureza das contas reprovadas,
define se a rejeição apresenta cunho de irregularidade insanável, possuindo
característica de nota de improbidade (agora, dolosa) e, assim, reconhece o
impeditivo à capacidade eleitoral passiva. O julgador eleitoral deve
necessariamente partir da conclusão da Corte administrativa sobre as contas
apreciadas, para definir a existência da irregularidade insanável que configure
ato doloso de improbidade, de modo a caracterizar inelegibilidade."
(ZÍLIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 5ª Ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico,
2016, p. 230-231). A seu turno, José Jairo Gomes preleciona que, "dentro
de sua esfera competencial, tem a Justiça Eleitoral plena autonomia para
valorar os fatos ensejadores da rejeição das contas e fixar, no caso concreto,
o sentido da cláusula aberta `irregularidade insanável¿, bem como apontar se
ela caracteriza ato doloso de improbidade administrativa" (GOMES, José
Jairo. Direito Eleitoral. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 216).
Tal orientação
encontra eco na remansosa jurisprudência deste Tribunal Superior, vejamos:
¿IMPUGNAÇÃO AO
REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES SUPLEMENTARES. 2015. PREFEITO E
VICE-PREFEITO. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, g, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90.
CONTAS REJEITADAS PELO TCE. IRREGULARIDADE. AQUISIÇÃO DE DOIS SOFTWARES SEM
LICITAÇÃO. PREMISSAS FÁTICAS DO ARESTO REGIONAL. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE. FALHA
DE NATUREZA FORMAL. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DOLOSO. NÃO CONFIGURADO.
DECISÃO MANTIDA. DESPROVIMENTO.
1. A Justiça
Especializada Eleitoral detém competência constitucional e legal complementar
para aferir, in concrecto, a configuração de irregularidade de cariz insanável,
ex vi dos arts. 14, § 9º, da CRFB/88 e 1°, I, g, da LC n° 64/90, outrossim
examinar se aludido vício qualifica-se juridicamente como ato doloso de
improbidade administrativa.
[...]" .
(AgR-REspe n°
39-64/RN, de minha relatoria, DJe de 21/9/2016);
"ELEIÇÕES
2014. REGISTRO. DEPUTADO ESTADUAL. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, G, DA LC Nº
64/90.
1. Nos termos
da alínea g do art. 1º, I, da Lei das Inelegibilidades, cabe à Justiça
Eleitoral verificar se a falha ou irregularidade constatada pelo órgão de
contas caracteriza vício insanável e se tal vício pode ser, em tese, enquadrado
como ato doloso de improbidade.
[...]" .
(RO n°
884-67/CE, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 14/4/2016); e
"ELEIÇÕES
2014. REGISTRO DE CANDIDATURA. DEPUTADO ESTADUAL. RECURSO ORDINÁRIO. REJEIÇÃO
DE CONTAS. TRIBUNAL DE CONTAS. CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL. PREFEITO. ORDENADOR DE
DESPESAS. INELEGIBILIDADE. ALÍNEA G. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO.
[...]
3. Cabe à
Justiça Eleitoral, rejeitadas as contas, proceder ao enquadramento das
irregularidades como insanáveis ou não e verificar se constituem ou não ato
doloso de improbidade administrativa, não lhe competindo, todavia, a análise do
acerto ou desacerto da decisão da corte de contas. Precedentes.
[...]" .
(RO n°
725-69/SP, Rel. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 27/3/2015).
O Tribunal
Regional Eleitoral do Ceará, após debruçar-se sobre o arcabouço
fático-probatório, concluiu que as irregularidades apuradas na prestação de
contas de Carlos Marduque Silva Duarte - enquanto exerceu o cargo de Presidente
da Câmara do Vereadores ? com lastro na decisão irrecorrível exarada pelo Órgão
de Contas, consubstanciaram ato doloso de improbidade, além do que causaram
lesão ao erário e enriquecimento ilícito.
Em abono de
sua pretensão, o Recorrente aponta equívocos no aresto adversado, advogando,
inicialmente, que o Tribunal de Contas, ao considerar irregular o aumento dos
subsídios dos Vereadores, utilizou parâmetro errado na quantidade de
habitantes. Além disso, assevera que não houve ultraje à Lei das Licitações,
considerando que realizou o devido processo licitatório para aquisição de
combustível, deixando apenas de enviar cópias dos documentos alusivos ao
certame. Aduz também que as irregularidades apuradas não teriam aptidão para
caracterizar a inelegibilidade da alínea g.
Impende verificar
o que consignado no acórdão do Regional (fls. 1.802 - 1.810):
"Cabe
avaliar, de pronto, a questão de o Tribunal de Contas dos Municípios ter ou não
atribuído, nos acórdãos que rejeitaram as contas, a nota de improbidade
administrativa.
Nesse tocante,
destaco precedente deste Regional que deixa clara a inexistência de qualquer
submissão ou vinculação da Justiça Eleitoral ao entendimento indicado pelo
Tribunal de Contas, quando da tipificação dos fatos em seu acórdão. Em outras
palavras, a ausência da nota de improbidade no Acórdão do Tribunal de Contas
não impede o reconhecimento desta pela Justiça Eleitoral, verbis:
[...]
Alegou, ainda,
o Recorrente que foi eleito em pleitos anteriores mesmo diante das mesmas
tentativas de lhe atribuir a pecha de inelegível. Nesse aspecto, é cediço que
as condições de elegibilidade são aferidas no momento do registro de
candidatura, não podendo se valer o candidato do fato de ter seu registro
deferido em eleições pretéritas, conforme dispõe o § 10 do art. 11 da Lei das
Eleições.
Conforme
consta dos pedidos de impugnação e documentos acostados, o Recorrente, no
exercício do cargo de Presidente da Câmara Municipal de Limoeiro do Norte, teve
suas contas julgadas irregulares em definitivo pelo Tribunal de Contas dos Municípios
do estado do Ceará por meio das seguintes decisões:
1) Acórdão nº
4.252/2009 (Recurso de Reconsideração), exarado nos autos do Processo nº
2005.LIM.PCS.11994/06 - Exercício 2005 - referente ao descumprimento ao
disposto no art, 29, VI, CF/88, que trata da remuneração máxima dos vereadores
(fls. 760/764, voI. 4).
2) Acórdão nº
2.234/2009 (Recurso de Reconsideração), exarado nos autos do Processo nº
2006.LIM.PCS.10870/07, referente à aquisição de combustível sem processo
licitatório junto aos credores Bezerra e Filho Ltda., no valor total de R$
25.840,80 (fls. 27/33).
Pesa ainda
contra o Recorrente condenação em primeiro grau por improbidade administrativa,
exarada nos autos da Ação Civil Pública nº 8297-51.2010.8.06.0115 proposta pelo
Ministério Público junto à 2ª Vara da Comarca de Limoeiro do Norte/CE. Contudo,
à mingua de decisão colegiada ou transitada em julgado, afasto, de plano, a
incidência da inelegibilidade prevista na alínea "L" do inciso I, do
art. 1° da Lei Complementar nº 64/90, que considera inelegíveis os condenados à
suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida
por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que
importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.
No que se
refere ao descumprimento ao disposto no art. 29, VI, CF/88, que trata da
remuneração máxima dos vereadores, o Tribunal de Contas dos Municípios
pronunciou-se, em sede de Recurso de Reconsideração, nos seguintes termos:
"Unidade
Gestora: Câmara Municipal de Limoeiro do Norte Natureza: Prestação de Contas de
Gestão ? Recurso de Reconsideração Exercício: 2005 - Acórdão nº 4252/2009
2 -
Verificou-se o descumprimento ao disposto no art. 29, inciso VI da CF, que
limita a remuneração dos vereadores em 30% da remuneração percebida pelos
Deputados Estaduais - (multa R$ 1.064,10 mantida)
O Recorrente
[...], comprovando que o Município de Limoeiro do Norte possui população
superior a 50.000 habitantes.
A Inspetoria,
após análise do documento acostado aos autos, chegou ao seguinte resultado:
Especificação
Valor (R$)
Remuneração
Mensal e individual recebida pelos Deputados Estaduais 9.540,00
Percentual
Máximo permitido, art. 29, inciso VI, da Constituição Estadual 40%
Remuneração
Mensal Máxima Permitida 3.816,00
Valor pago a
Vereador da Câmara Municipal de Limoeiro 3.870,00
Diante do
exposto, ratifica-se o descumprimento ao art. 29, inciso VI, da Constituição
Federal, uma vez que o limite na remuneração dos vereadores foi
descumprido" . [...]
Primeiramente,
é bom que se frise, a situação destes autos difere da situação encontrada no
Processo nº 34-27.2016, onde este Tribunal afastou a pecha de inelegível em
razão da ausência de dolo.
Naqueles
autos, o valor a maior pago aos Vereadores foi de apenas R$ 25,94, e somente
durante os três meses em que o candidato esteve à frente da Câmara Municipal
para cumprir "mandato-tampão", sem que se tenha vislumbrado dolo,
desonestidade ou má-fé na conduta do administrador.
Extraio trecho
do Voto proferido pela eminente Desa Nailde Pinheiro, naqueles autos:
"Ora, na
situação dos autos, ainda que o gestor público tenha se afastado da disciplina
legal, o fato é que não se vislumbra ter havido dolo, desonestidade ou má-fé do
administrador, o que impede qualquer conclusão, em registro de candidatura,
sobre conduta ímproba na modalidade dolosa.
A falta de
conduta dolosa ou má-fé se evidencia quando se sabe que o Recorrente assumiu o
cargo de Presidente da Câmara Municipal de Jati-CE para cumprir o chamado
mandato-tampão, por apenas três meses, tendo em vista a necessidade do titular
assumir temporariamente a prefeitura daquela cidade e, nesse curto prazo, seja
por negligência, imprudência ou imperícia, deu continuidade ao pagamento a
maior no subsídio dos Vereadores.
Assim, ante a
ausência de elementos mínimos que revelem o ato doloso de improbidade
administrativa, entendo que não incide na espécie a inelegibilidade referida no
art. 1°, inciso I, alínea g, da LC n° 64/1990."
Aqui, em que
pese a diferença de valores pagos a maior aos Vereadores sejam, aparentemente,
de pequena monta (R$ 54,00), tais valores foram
pagos a cada
um dos vereadores de Limoeiro do Norte durante todo o ano de 2005, não se
podendo alegar uma conduta culposa por parte do Recorrente.
Nesse ponto,
reproduzo trecho da bem elaborada sentença da Juíza de 1º grau, Dra. Flávia
Setúbal de Sousa Duarte, verbis:
"Deste
modo, presente está a figura do dolo, pois o impugnado não tem como alegar
desconhecimento do pagamento irregular, pois, como presidente da Câmara,também
recebeu o seu subsídio e tinha ciência dos valores pagos, donde deveria o
impugnado, diante da situação contrária ao limite estabelecido na Lei Maior ter
sobrestado o pagamento no tocante a parte superior ao permitido, a fim de
cumprir as normas legais e respeitar o princípio da legalidade a que deve se
submeter especialmente o administrador público,"
Conforme se
depreende, tal irregularidade, além de configurar vício insanável, encontra-se
tipificada como ato de improbidade administrativa, nos exatos termos do art.
10, incisos IX e XI e art, 11, inciso I, da Lei nº 8.429/923. É certo que o
reconhecimento da pecha de inelegibilidade pressupõe igualmente um ato doloso
e, nesse ponto, muito embora não se exija uma equiparação ao dolo presente na
responsabilidade penal, não se pode falar em qualquer atuação dolosa, e
portanto intencional, sem fazer referência a uma vontade dirigida ao alcance de
um determinado fim.
Em tal
contexto, oportuno lembrar que em sede de administração pública, a vontade do
administrador deve se confundir com a vontade legal, no alcance de uma única
finalidade: o interesse público, Ora, na situação dos autos, ao afastar-se o
gestor público da disciplina legal que, na hipótese, impunha ao administrador
uma conduta - obediência ao disposto no art. 29, VI, CF/88 ?, evidencia-se a
sua vontade de obter um fim dissociado do interesse público, circunstância a
revelar o dolo de seu agir.
Entendo,
ainda, que restou caracterizado do dolo, pois, conforme já pontuado, não é
exigido nos autos o dolo específico, conforme, inclusive, a linha de raciocínio
adotada pelo Tribunal Superior Eleitoral em precedente jurisprudencial do
corrente ano, verbis:
[...]
Assim, entendo
caracterizado o ato doloso de improbidade administrativa no que concerne aos
gastos com pagamento de vereadores em afronta ao art. 29, VI, da CF/88,
ocasionando prejuízo ao erário e enriquecimento ilícito do Recorrente.
Já em relação
à aquisição de combustível sem processo Iicitatório junto ao credor Bezerra e
Filho Ltda., no valor total de R$ 25.840,80, o Tribunal de Contas dos
Municípios pronunciou-se, em sede de Recurso de Reconsideração, nos seguintes
termos:
Processo nº
2006.LIM.PCS.10870/07 - fls. 27/33, vol. 1 - Ausência de licitação para
aquisição de combustível.
Interessado:
Câmara Municipal de Limoeiro do Norte
Natureza:
Recurso de Reconsideração
Exercício:
2006
Acórdão nº
2.234/2009
"04 -
Ausência das cópias dos contratos e Processos Licitatórios
referente ao
credor Bezerra e Filho Ltda. (Aquisição de Combustível R$ 25.840,80) - fls. 397
(Multa de R$ 2.128,20);", fI. 30, voI. 1. [...]
"Em sua
defesa, o interessado afirma que tais gastos foram precedidos de devido
Processo licitatório. Alega, entretanto, que não foi possível localizar os
respectivos certames nos arquivos da Câmara Municipal de Limoeiro do Norte.
Sendo assim,
tendo em vista que o defendente não apresentou os certames solicitados pelo
Órgão Técnico, ratifica-se a pecha, mantendo-se a MULTA anteriormente aplicada,
no valor de R$ 2.128,20 (dois mil, cento e vinte e oito reais e vinte
centavos), com base no art. 56,11, da Lei nº 12.160/93 c/c o art. 154, II,do
RITCM", fl. 32, voI. 1. (grifo original)
Conforme se
verifica, o trecho retrotranscrito traz referência expressa à ausência de
procedimento licitatório de responsabilidade do candidato, então Presidente da
Câmara de Vereadores do Município de Limoeiro do Norte/CE, no valor de R$
25.840,80, em benefício do credor Bezerra e Filho Ltda., além de outras
irregularidades.
O Acórdão do
Tribunal de Contas dos Municípios, confirmado em sede de Recurso de
Reconsideração, não deixa margem para dúvidas de que a omissão implicou em
grave infração à norma legal ou regulamentar de natureza contábil, financeira,
orçamentária, operacional e patrimonial, quando expressamente afirma o
malferimento ao art. 56, 11 da Lei Estadual nº 12.160/934 (Lei Orgânica do
Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará).
Frise-se,
ainda, que os atos de improbidade administrativa possuem definição legal,
encontrando-se a dispensa indevida de licitação como uma das situações
expressamente previstas em lei a atribuir ao gestor público uma atuação
ímproba, nos precisos termos do artigo 10, inciso VIII, da Lei nº 8.429/92.5
Nesse tocante,
a Justiça Eleitoral, pela voz de seus Tribunais, tem reiteradamente entendido
que a ausência de licitação constitui ato doloso de improbidade administrativa,
como dão exemplo os julgados colacionados a seguir:
[...]
Assim sendo,
de acordo com os acórdãos supracitados, o candidato teve as suas contas
rejeitadas pelo Tribunal de Contas dos Municípios. Tais decisões, além de
proferidas pelo órgão competente, são definitivas e não se encontram afastadas
pelo Poder Judiciário, sendo certo que revelam igualmente irregularidades
insanáveis, porquanto a ausência de procedimento licitatório, como é de todos
sabido, macula irremediavelmente a atuação do gestor, seja por desconsideração
aos princípios que regem a Administração Pública, seja por afastar a
concorrência legítima e necessária à contratação mais vantajosa para a
Administração Pública.
No caso dos
autos, as omissões detectadas pela Corte de Contas inserem-se igualmente no
conceito de ato de improbidade administrativa, ensejando a inelegibilidade do
Candidato Impugnado, nos termos da alínea "g", inciso I do art. 1° da
Lei Complementar 64/90, uma vez que presentes todos os requisitos
caracterizadores da inelegibilidade prevista nesta alínea, quais sejam: i)
contas rejeitadas; ii) irregularidade insanável; iii) ato doloso de improbidade
administrativa; iv) decisão irrecorrível do órgão competente; e v) decisão não
suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.
Quanto ao
último requisito, convém ressaltar a inexistência de notícia acerca de decisão
suspensiva ou anulatória pelo Poder Judiciário da rejeição das contas do
Recorrente, e não havendo dúvida quanto à presença de todos os demais elementos
necessários ao reconhecimento da causa de inelegibilidade, o indeferimento do
registro de candidatura do candidato Recorrente é medida que se impõe" .
Conforme
assentado pelo Regional, a rejeição das contas do candidato pelo Órgão de
Controle - considerando a não observância dos limites impostos no art. 29, VI,
da Constituição da República e a dispensa indevida de licitação para aquisição
de combustível -, configura ato doloso de improbidade administrativa, além do
que causaram lesão ao erário e enriquecimento ilícito.
Além disso,
faz ver da moldura fática, que o Tribunal de Contas ao ratificar o
descumprimento do dispsoto no art. 29, VI, da Lei Maior, já havia considerado
que o Município de Limoeiro do Norte/CE possui mais de 50.000 (cinquenta mil)
habitantes.
Consignou
ainda que, para a configuração da referida inelegibilidade, basta o dolo
genérico, que se caracteriza quando o administrador assume os riscos de não
atender os comandos constitucionais e legais, que vinculam a Administração
Pública. Acrescentou, ainda, que no caso em análise houve reiteração da
irregularidade concernente a não observância dos limites estabelecidos no art.
29, VI, da Constituição da República.
Ademais,
consta do acórdão atacado que o candidato não logrou êxito em conseguir tutela
judicial favorável para afastar a rejeição das contas.
Como se
percebe, é possível concluir, sem maiores dificuldades, que o acórdão fustigado
não merece reprimendas. A gravidade das irregularidades apuradas se revela
suficiente para comprovar a prática de ato doloso de improbidade
administrativa, notadamente a inobservância do limite imposto pelo art. 29, VI,
da Constituição da República, atraindo por via de consequência a
inelegibilidade preconizada no art. 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/1990.
Aludido
entendimento encontra eco na jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral:
"ELEIÇÕES
2012. REGISTRO DE CANDIDATURA. VEREADOR. CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º,
INCISO I, ALÍNEA G, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. DESNECESSIDADE DE IMPUTAÇÃO
EM SEDE DE AÇÃO PENAL OU CIVIL PÚBLICA. PRECEDENTES. DECISÃO DO TRIBUNAL DE
CONTAS. CONCESSÃO DE REAJUSTE A VEREADORES E PAGAMENTO A TÍTULO DE PARTICIPAÇÃO
EM SESSÕES EXTRAORDINÁRIAS. OFENSAS À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IRREGULARIDADES
INSANÁVEIS E ATOS DOLOSOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREVISÃO DESSAS
DEPESAS EM LEI MUNICIPAL OU RESOLUÇÃO DA CÂMARA DE VEREADORES. FATO INCAPAZ DE
AFASTAR A OBRIGAÇÃO DE CUMPRIR OS DITAMES E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO.
[...]
2. O reajuste
dos vencimentos dos vereadores para a mesma legislatura bem como o pagamento a
eles a título de participação em sessões extraordinárias configuram
irregularidades insanáveis, acarretando dano ao erário, em patentes violações à
Constituição Federal, aptas a atrair a incidência da causa de inelegibilidade
prevista no art. 1º, inciso I, alínea g, da Lei Complementar nº 64/90.
3. O fato de
as despesas estarem previstas em lei municipal ou em resolução da Câmara de
Vereadores não elide o dever do agente público de observar os princípios que
norteiam a administração pública e, principalmente, a Constituição Federal.
4. Agravo
regimental desprovido."
AgR-REspe nº
121-97/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 1º/4/2013).
ELEIÇÕES 2014.
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. INELEGIBILIDADE. CONTAS. REJEIÇÃO. LEI DE
LICITAÇÕES. ART. 1º, I, G, LC Nº 64/90. INCIDÊNCIA.
1. As diversas
dispensas indevidas de licitação, aliadas a irregularidades também reiteradas
quanto ao repasse de verbas públicas, acarretam a inelegibilidade descrita na
alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90, por configurar tal prática
vício insanável e ato doloso de improbidade administrativa.
2. O dolo a
que alude o referido dispositivo legal é o genérico, e não o específico, ou
seja, a simples vontade de praticar a conduta em si que ensejou a improbidade.
3. Em sede de
agravo regimental, não se admite inovação de teses recursais.
4. Agravo
regimental desprovido.
(Agravo
Regimental em Recurso Ordinário nº 14326, Acórdão de 17/12/2014, Relator(a)
Min. LUCIANA CHRISTINA GUIMARÃES LÓSSIO, Publicação: PSESS - Publicado em
Sessão, Data 17/12/2014 )
Ressalto, por
fim, que a aferição de possíveis erros ou acertos da decisão do Tribunal de
Contas não é de competência desta Justiça especializada, a teor do que
preconiza o Enunciado nº 41 de Súmula deste Tribunal Superior.
Ex positis,
nego provimento ao recurso especial, mantendo, por via de consequência, o
indeferimento da candidatura de Carlos Marduque Silva Duarte.
Publique-se em
sessão.
Brasília, 14
de dezembro de 2016.
MINISTRO LUIZ
FUX
Relator